Assinalando o 25 de Abril

— Há povos que não saberiam viver em democracia. Só a ditadura os pode fazer funcionar.
— Mas a democracia também se aprende e se não se vive nunca se aprende — reclamei.
— Pois, mas quando falta a preparação, democracia é sinónimo de caos.
— Mas não há maneira de se exercitar a democracia senão vivendo-a — insisti.
— Pode-se aprender gradualmente.
— Só que não há gradualidade na ditadura. Ou há ditadura, com tudo o que isso implica, ou não há ditadura. O meio termo é impossível.
— Não me parece — retorquiu. — Então e o caso da Espanha?
— A Espanha só pôde aprender a liberdade quando morreu o ditador. É que todo o ditador, na sua arrogância, se julga imprescindível. E mesmo quando diz que irá preparar o povo para a democracia, a verdade é que nunca reconhece estar concluído o tempo da preparação. E até pode ter razão porque a verdade é que só em democracia se aprende a liberdade. É assim também com as crianças. Se as defendermos da possibilidade de tomarem opções, nunca aprenderão a tomá-las convenientemente. É no acto de exercer a liberdade que se aprende a fazê-lo. A democracia pode ter gradações. É sempre possível um sistema ser mais ou menos democrático; nenhuma democracia está plenamente cumprida; desenvolve-se através de um processo frágil e sempre inacabado. A ditadura é um sistema em que toda a população está sob a tutela de alguém que se julga detentor da verdade e salvador da pátria. À excepção do ditador e dos seus apaniguados (sempre sob a sua atenta inspecção), ninguém mais pode intervir livremente na construção da sociedade em que vive. São todos simples executores de ordens emanadas da autoridade suprema, imune a qualquer crítica.

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